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Um mergulho na história política de Campina e a dificuldade da “terceira via” – Por Ytalo Kubitsheck

Já comentei em artigo recente que a polarização entre duas candidaturas que obterão mais de 90% votos será uma realidade nas urnas da maioria absoluta dos municípios paraibanos nas eleições municipais deste ano, uma torrente devastadora que centraliza o debate político em apenas duas forças antagônicas.

Porém, nas duas maiores cidades da Paraíba, que tem segundo turno, João Pessoa e Campina Grande, o quadro pode ser diferente.

Na Rainha da Borborema, por exemplo, desde 1976, com a eleição de Enivaldo Ribeiro contra Ivandro Cunha Lima, que a cidade ficou dividida eleitoralmente em dois blocos políticos que a governam até os dias atuais, Cunha Lima e anti-Cunha Lima.

Em 1982, por exemplo, Ronaldo Cunha Lima, irmão de Ivandro, venceu Antônio Vital do Rêgo, candidato a sucessão apoiado pelo então prefeito Enivaldo Ribeiro. A partir desta eleição, nos últimos 42 anos, o grupo Cunha Lima governou a cidade durante 34. Os 8 anos de intervalo foram no governo Veneziano Vital do Rêgo, entre 2005 e 2013.

Ou seja, Campina Grande foi educada nos últimos 48 anos a ser contra ou a favor do grupo Cunha Lima.

Ressalte-se a disputa pelo protagonismo na oposição desde 1982 entre os grupos Vital do Rêgo e Ribeiro, desde as eleições de 2004, quando o grupo Cunha Lima passou a sempre capitular uma das duas forças de oposição para o seu fortalecimento. Foi assim desde conquistou a adesão da jovem Daniella Ribeiro para vice do então presidente da Assembleia Legislativa, Rômulo Gouveia, mantendo um pacto de não-agressão com o grupo Ribeiro contra o grupo Vital do Rêgo nas últimas cinco eleições municipais (2004, 2008, 2012, 2016 e 2020).

Agora em 2024, o pacto será celebrado com os Vital do Rêgo. Os Ribeiros, obviamente, estarão em lado oposto.

O sentimento político de polarização, acirrado por Enivaldo e Ronaldo, permaneceu aceso com o filho Cássio Cunha Lima, deputado federal constituinte, beneficiado pelas disposições transitórias que permitiram filhos sucederem pais em 1988. Diante da boa aceitação da gestão de Ronaldo, Enivaldo, que havia vencido Ivandro, sofre sua primeira derrota como candidato a prefeito, ficando assim mais uma vez Campina dividida entre Cunha Lima e Ribeiro.

2004

O embate entre Cunha Lima e Ribeiro se repetiu até a eleição de 2004, com o surgimento de novas lideranças no bloco de oposição contra Cunha Lima, isso diante das sucessivas derrotas de Enivaldo Ribeiro (três para Cássio Cunha Lima e uma para Félix Araújo).

Surge no cenário, no final dos anos 90, a sindicalista Cozete Barbosa, apoiada nos bastidores pelo grupo Cunha Lima na disputa ao Senado em 1998, contra dois desafetos do grupo, Tarcísio Burity e Ney Suassuna. A sindicalista surpreende vencendo a eleição nas urnas de Campina, contra um senador e um ex-governador, sendo alçada como vice de Cássio em 2000, derrotando mais uma vez Enivaldo Ribeiro e Vital do Rêgo Filho, evitando que a líder sindical do PT se tornasse um forte nome da oposição contra o grupo Cunha Lima.

Cozete assume o cargo com a renúncia de Cássio para disputar o Governo da Paraíba em 2002. Eleito governador pelo PSDB em oposição ao presidente eleito, Lula, o tucano, mesmo após dois anos de paz com Cozete, teme uma possível união entre a petista e Enivaldo. Decide, então, atrair o grupo Ribeiro e romper com Cozete. A partir da aliança Cunha Lima-Ribeiro, nasce a força politica que viria a governar Campina Grande nos próximos 8 anos: o então jovem vereador Veneziano Vital do Rêgo, que já vinha trabalhando o seu nome como nova liderança política no bloco de oposição juntamente com Enivaldo Ribeiro e seu irmão Vital Filho, que até já havia sido candidato a vice-prefeito de Enivaldo Ribeiro contra Cássio Cunha Lima em 1996.

Enivaldo até pensou em voltar a disputar a PMCG, novamente em 2004, tentando manter o vereador Veneziano ao seu lado. Para garantir um partido forte, Veneziano, com o apoio dos senadores Ney Suassuna e Zé Maranhão, deixa o PDT e se filia ao PMDB, sustentando sua candidatura e rejeitando ser vice de Enivaldo e tirando do ex-prefeito o protagonismo da oposição.

Com o governo eivado por denúncias de corrupção, Cozete foi um fiasco eleitoral e não alcançou sequer os dois dígitos. Veneziano se tornou a sensação eleitoral do momento, apesar de perder a eleição no 1º turno para Rômulo, Cozete tem mais de 18 mil votos e consegue gerar o segundo turno, onde Veneziano conquista a virada, com os votos dos eleitores de Cozete.

O sentimento anti-Cunha Lima, que prevaleceu na eleição, deixou Enivaldo Ribeiro, capitulado por Cássio, extremamente fragilizado. O crescimento de Veneziano no bloco de oposição ao grupo Cunha Lima começa a ofuscar a família Ribeiro.

Os eleitores do Grupo Cunha Lima não gostaram da união entre Cunha Lima e Ribeiro, a mesma coisa se deu diante os eleitores da família Ribeiro que eram anti-Cunha Lima, ficaram com raiva de Enivaldo e passaram a ter Veneziano como o novo chefe do sentimento anti-Cunha Lima em Campina, deixando assim a família Ribeiro nas margens do quase nada da política campinense.
 
No 1º turno, Veneziano tachava Cozete como membro do grupo dos 22 anos (grupo Cunha Lima), mas no 2º turno, visando o seu apoio, Veneziano muda o discurso e passa a chamar o clã Cunha Lima de grupo dos 20 anos, absolvendo a então prefeita.
 
A vitória de Veneziano contra Rômulo o faz ser oficialmente o novo chefe de oposição aos Cunha Lima em Campina Grande. Quatro anos se passam e, mais uma vez, vem a briga do sentimento Cunha Lima contra o anti-Cunha Lima, tendo agora um novo nome, o prefeito Veneziano e não mais os Ribeiros que estavam agora apoiando a família Cunha Lima.
 
O efeito negativo da união de Ribeiro com Cunha Lima não só gerou a derrota para prefeito em Campina, em 2004, como o próprio Enivaldo Ribeiro também perde a eleição para deputado federal em 2006.

2008
 
Em 2008, Rômulo Gouveia é indicado novamente para enfrentar Veneziano, e por não ter a mesma força política de quando era deputado federal, Enivaldo resolve lançar sua filha Daniella como candidata a vereadora. Rômulo perde a segunda eleição para Veneziano, porém Daniela é eleita vereadora, com menos de 5 ml votos, abaixo do esperado para quem havia sido vice na chapa de Rômulo na eleição anterior, demonstrando assim que a família Ribeiro corria sério risco de entrar em decadência política, diante do apoio dado aos Cunha Lima, em 2004 e 2008. Se a família Ribeiro tivesse boa aceitação eleitoral em Campina, o normal seria Daniella ser a vereadora mais votada em Campina, entretanto o mais votado foi o então vereador Inácio Falcão, ligado, na época, ao grupo Cunha Lima.
 
Daniella assume sua vaga na Câmara de Campina e passa a ser uma forte opositora da administração de Veneziano. Após um ano e meio, Daniella se lança deputada estadual e seu irmão, Aguinaldo Ribeiro se lança como deputado Federal ao lado do grupo Cunha Lima, tendo Ricardo Coutinho como candidato ao governo e Cássio como senador. A família Ribeiro decidiu abrir mão de vice para Daniella em favor de Rômulo Gouveia, com o compromisso verbal de Cássio que o grupo não lançaria outro nome para substituir Rômulo na Câmara Federal, facilitando a eleição de Aguinaldo e Damião Feliciano, que também buscava a vaga de vice para sua esposa Lígia. No dia seguinte, o tucano muda de ideia e decide lançar o então deputado estadual Romero Rodrigues como substituto de Rômulo, escolhido por Ricardo Coutinho como vice porque tinha mais força eleitoral que Daniella na Rainha da Borborema.
 
No dia da convenção (PSDB-PSB), no Clube Cabo Branco, Daniella, seu pai e irmão estavam presentes, porém decidiram romper com a dupla Ricardo e Cássio para apoiarem a candidatura de José Maranhão. O espólio da votação de Rômulo seria amenizado pela aliança com o deputado federal Vital do Rêgo Filho, candidato ao Senado apoiado pelos Ribeiros. Mais uma vez, o grupo Ribeiro muda de lado, trocando o grupo Cunha Lima por uma aliança pontual com o grupo Vital do Rêgo, a quem fazia oposição desde 2004.
 
Ricardo Coutinho é eleito para o governo, Cássio Cunha Lima também se elege para o Senado, Aguinaldo e Daniella são eleitos deputados federal e estadual. Daniella se porta como oposição a Ricardo na Assembleia Legislativa, da mesma forma que se portou como oposição ao governo de Veneziano na Câmara de Campina.

2012
 
Com o fim do segundo governo de Veneziano e aguardando o apoio do prefeito a Daniella, já que ambos eram adversários de Ricardo Coutinho, mas Veneziano rejeita o acordo e Daniella se lança candidata a prefeita de Campina pelo PP, logo ela diz ser independente e passa a atacar novamente o governo de Veneziano e sua candidata escolhida, a secretária de Saúde, Tatiana Medeiros.

Daniella faz no primeiro turno uma campanha contra os grupos Vital do Rêgo e Cunha Lima, mas no segundo turno orienta seus aliados a votarem contra Veneziano, ajudando Romero Rodrigues, que vence Tatiana com ampla maioria.  
  
2016

O embate entre os Cunha Lima e os Vital do Rêgo se acentua após a adesão dos irmãos Vital no segundo turno das eleições estaduais de 2014 para Ricardo Coutinho contra Cássio Cunha Lima na disputa ao governo.

Dois anos depois, Veneziano, eleito deputado federal mais votado da cidade, decide peitar Romero. Isolado politicamente e sem apoio sequer do PSB, que lança o presidente da Assembleia Legislativa, Adriano Galdino, Veneziano não consegue forçar o segundo turno e alcança apenas 25% dos votos, contra 63% de Romero, uma das maiorias mais acachapantes da história política de Campina. Enivaldo Ribeiro retorna as disputas eleitorais como vice de Romero, retirando a pré-candidatura de Daniella para matar a eleição no primeiro turno. Objetivo alcançado.

2020

Por estar em seu segundo mandato, Romero Rodrigues, do PSD, não pode se candidatar a reeleição. Apesar da predileção pelo deputado estadual Tovar Correia, casado com a sobrinha de dona Glória Cunha Lima, mãe de Cássio e tia do então prefeito. Romero se rende aos apelos de Ivandro Cunha Lima e aceita apoiar Bruno Cunha Lima, neto de Ivandro, para sua sucessão.

Bruno é eleito ainda no primeiro turno, com 111 mil votos superando a esposa de Veneziano, Ana Cláudia Vital, segunda colocada, com 44 mil, repetindo a polarização. Dois anos antes, em 2018, Veneziano havia sido eleito para o Senado, assim como Daniella, companheiro de chapa de Cássio, que não se reelege. O grupo Cunha Lima, em nome da sobrevivência política, engole o choro pela derrota de Cássio e mantém a aliança com os Ribeiros, que desta vez indica o jovem Lucas Ribeiro, filho de Daniella e neto de Enivaldo, como vice de Bruno.

Dois anos depois, Lucas Ribeiro se elege vice-governador de João Azevedo, derrotando os grupos Cunha Lima e Vital do Rêgo, que lançam Pedro e Veneziano em trincheiras diferentes, mas que se unem no segundo turno contra Azevedo e Ribeiro.

Apesar da derrota, Pedro Cunha Lima dobra a votação de João Azevedo em Campina Grande.

2024

O cenário que agora se desenha em Campina Grande é a ruptura do ex-prefeito Romero Rodrigues com o atual Bruno Cunha Lima.

O grupo Ribeiro não soube capitalizar a rejeição da união entre os Cunha Lima e os Vital do Rêgo. Com isso, Romero Rodrigues, se colocou na posição de depositário da nova conjuntura, que além de condenar uma contradição, traz um grande desgaste político do atual prefeito Cunha Lima. Mas segue a dificuldade de construção de uma terceira via, seja com a família Ribeiro, que comanda o PP e o PSD, há muito tempo sem protagonismo na cidade, ou no PSB do governador João Azevedo. A preocupação maior desses dois grupos, na verdade, é com 2026.

Até a tentativa de fazer Bruno desistir da reeleição já foi feita, sem êxito.

Se o deputado estadual Inácio Falcão for confirmado como vice de Romero Rodrigues, tudo leva a crer que a polarização será, insolitamente, da família Cunha Lima (do poeta Ronaldo) contra a família Rodrigues (de dona Glória).

Tudo em casa. É a roda da história.

Por Ytalo Kubitschek

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